segunda-feira, 4 de maio de 2009

Leitura séria

Recebi esse texto de Língua e não queria passar batido. Primeiro que eu sou fumante e, já fiz vários posts a esse respeito, mas não posso deixar de falar sobre isso depois que foi aprovada aquela lei ri-dí-cu-la em São Paulo. Segundo por que acho que muitos de vocês, fumantes ou não concordarão com essa análise feita pelo colunista da Folha de São Paulo. Ele fala em caça às bruxas e da maneira com que nós sempre nos vemos nos meio de uma crise, seja ela econômica, social ou uma hecatombe natural. Camada de Ozônio, desmatamento da Amazônia. Seca no Rio Grande do Sul, enchentes em Santa Catarina. Morte da menina Isabela, Sequestro da Heloá. Crise dos tigres asiáticos, Crise americana. Gripe aviária, gripe suína, gordura trans.

Me lembro como se fosse hoje do dia em que essa dita foi aprovada. Antes havia sido noticiadas no Jornal Nacional manchetes sobre o terremoto na Itália, um ataque terrorista a um time de futebol, a proibição do acesso à imprensa a dados sobre gastos do senado, etc, etc. Dentre tantas outra vergonhas vinham os fumantes. A imagem do Kamikaze ocidental e contemporâneo.

É meio que uma notícia velha mas pode gerar uma discussão bacana. Do quanto a gente percebe se nos distanciarmos de determinados temas. De como determinadas análises devem ser feitas diariamente. De como nós devemos deixar de ser espectadores e exercitarmos um pouquinho nossos alfarrábios mentais. Boa leitura.


A necessidade de achar um inimigo

MARCELO COELHO
COLUNISTA DA FOLHA

Entendo, até certo ponto, que proíbam o cigarro em bares e restaurantes. Mesmo com áreas divididas, os garçons terminam sofrendo as consequências do fumo passivo. Mas impedir que alguém fume dentro de um quarto de hotel? Sem ninguém por perto? Lembro ainda que em muitos hotéis existem andares exclusivos para quem não fuma. Nem mesmo o resquício de um cheiro de cigarro incomodaria os mais sensíveis.

Houve tempo em que os fanáticos de direita procuravam comunistas até debaixo da cama. Mas nem debaixo da cama o fumante poderá se esconder, pelo o que diz a lei recentemente aprovada pela Assembleia Legislativa de São Paulo. Debaixo de marquises também não. Pode-se fumar em terraços, desde que não tenham cobertura. Assim, quem sabe, será mais fácil identificar o fumante de longe e fuzilá-lo com um rifle de alta precisão.

No fundo, acredito que esses exageros do antitabagismo correspondem a essa necessidade, tão comum nos EUA, e imitada aqui, de encontrar um inimigo com quem lutar. Acabou-se a ameaça comunista, e os membros da Al Qaeda não são tantos a ponto de mobilizar uma caçada coletiva que valha a pena.

Os fumantes, entretanto, estão em todo lugar -com a vantagem de se esconderem cada vez mais. Deixam sinais de sua presença. São nocivos, malignos, suicidas. Quanto mais cercados, quanto mais restrita a sua área de atuação, mais fácil e divertido será persegui-los. Não acho que exista sadismo da parte dos perseguidores. O mecanismo é mais complexo.


Terror

O Estado e a população impõem um regime de terror sobre alguma minoria. Identificam nessa minoria uma ameaça: são "eles" os terroristas, são "eles" que nos perseguem, são "eles" que querem nos destruir. Dito isso, podemos perseguir, aterrorizar e destruir. "Eles" é que começaram.

O cigarro mata, claro. Quem não tem medo da morte? E eis que surge o grupo dos fumantes renitentes, que parece não ligar para isso. Os fumantes escarnecem de nosso medo da morte. Fica fácil, dessa perspectiva, identificá-los com terroristas. A tentação para a caça às bruxas se torna muito grande. Instituir o Terror sempre foi o ato reativo de quem está aterrorizado. Tome-se cuidado, entretanto. O fogo que queima as feiticeiras também costuma exalar muita fumaça cancerígena.